Cultura

Série ‘Hebe’ mostra trajetória e contradições da apresentadora

“Eu não tenho medo de morrer. Eu tenho peninha.” É com essa resposta de Hebe (1929-2012) para Marília Gabriela, em uma entrevista de 2010, que começa “Hebe”, série em dez episódios desenvolvida pelos Estúdios Globo, que estreou na última quarta (11) no Globoplay.

A produção é um projeto complementar ao filme “Hebe – A Estrela do Brasil”, que chegou aos cinemas em setembro passado.

Em ambos, o trabalho é encabeçado pela roteirista Carolina Kotscho, com Maurício Farias na direção artística e Andréa Beltrão no papel da apresentadora, que era conhecida do público pelo seu visual extravagante (sempre repleto de joias) e posições fortes (e muitas vezes polêmicas).

Enquanto o longa se concentra nos anos 1980, quando Hebe troca a Band pelo SBT, a série comtempla praticamente a vida inteira da artista, desde os 14 anos até a sua morte. A atriz Valentina Herszage, 21, interpreta a artista da adolescência até os 28 anos. A partir daí, Beltrão assume o papel, que interpretou nos cinemas.

Para Andréa Beltrão, que chegou a ser entrevistada por Hebe no fim dos anos 1980, quando fazia Zelda Scott do seriado “Armação Ilimitada” (Globo,1985-1988), a série mostra facetas da artista que são surpreendentes e pouco conhecidas pelo grande público, como o fato de ela ter uma origem pobre e de ter sido arrimo de família durante muitos anos.

“O que eu conhecia da Hebe era o que a gente sabia da televisão, uma mulher exuberante, excêntrica, à direita, conversadora e polêmica. Mas eu não sabia que ela tinha tido um casamento tardio, que ela queria muito ter um filho, não sabia que ela tinha feito um aborto, que ela tinha tido uma paixão pelo empresário Luís Ramos (vivido na trama por Daniel Oliveira)”, afirmou Beltrão, em painel sobre a produção na Comic Con Experience (CCXP), evento de cultura pop realizado em São Paulo na semana passada.

Para o diretor Maurício Farias, a apresentadora foi uma mulher muito à frente do seu tempo em diversos aspectos, mas, ao mesmo tempo, ela também era muito da sua época, uma mulher “que queria casar e ter filhos”.

Para Carolina Kotscho, o grande desafio de fazer a série foi como contar a história de uma mulher que ficou 60 anos no ar e teve uma “vida extraordinária” em dez capítulos. “Todo o mundo lembra da Hebe mais velha, do brilho, da alegria de viver, do sorriso, mas ela ao longo da vida comprou muitas brigas e enfrentou muitos desafios. Então, a Hebe é esse mito, é essa lenda, mas a série mostra uma Hebe com dramas comuns a qualquer um de nós”, disse ela.

Apesar de ter sido uma mulher conservadora, malufista e muito criticada por isso, Carolina afirmou que a apresentadora já defendia em 1980 causas e valores que para ela eram importantes, embora fossem considerados tabus na época. “Ela foi uma das primeiras mulheres a falar de aborto, ela defendia a liberdade de expressão, defendia a causa LGBT.”

Para mergulhar na vida da artista, Carolina contou que teve acesso ao acervo da família, mas outra ajuda fundamental foi de uma fã, que guardou todos os recortes de revistas e jornais desde que a Hebe estreou no rádio aos 14 anos até o fim da vida dela. “Eram mais de 3.000 recortes organizados em álbuns de capa dura, uma Hebe ali na primeira pessoa, sem edição”, disse.

Mesmo se apresentadora estivesse viva e fosse contar a sua própria vida, Carolina afirmou que encararia o relato como mais uma versão da história, “porque a gente edita a nossa memória, e eu tinha ela sem cortes, com todas as contradições e as transformações.”

Na série, toda essa trajetória da artista não é contada de forma linear, mas a partir de um fluxo de memória da própria Hebe. A história mostra também amigos famosos da apresentadora, como Nair Bello (1931-2007), Lolita Rodrigues, Roberto Carlos, Agnaldo Rayol, entre outros.

ABERTA AO DIÁLOGO

Para Andréa Beltrão, o maior aprendizado de mergulhar na história da Hebe foi ver como, apesar das muitas críticas que recebia, ela não tinha medo de se expor, de errar, de “falar com todo o mundo, de ser quem ela era”.

“Entre todas as qualidades, defeitos e características marcantes, tem uma coisa que eu até li em uma crônica de Rubem Braga, mas quando eu li, eu pensei nela: ‘Tão sincera e muitas vezes errada, mas sempre sincera”, disse.

A atriz também afirmou que Hebe era uma pessoa disposta ao diálogo, a ouvir o que outras pessoas tinham a dizer, mesmo àquelas das quais ela discordava “agudamente”.

Carolina Kotscho compartilha de opinião semelhante e disse acreditar que é por abrir esse espaço à conversa que a história continua atual. “Ela era uma pessoa que passou a vida inteira fazendo perguntas que é o que eu acho que faz tanta falta hoje em dia. Todo o mundo tem tantas certezas, e a Hebe representava um interesse genuíno na opinião do outro, com respeito e generosidade”, afirmou.

Beltrão contou que levou um susto com o convite de Carolina para interpretar a artista, já que ela nunca se achou parecida com a apresentadora e tem um sotaque carioca bem carregado. “Eu escalei uma montanha grande, porque tive de fazer muita aula de prosódia, expressão corporal, mergulhar muito na vida dela.”

Valentina também disse que ficou surpresa ao ser chamada para interpretar a Hebe jovem, porque não sabia que o cabelo natural da apresentadora era escuro, e não o loiro que virou uma das suas marcas registradas na TV.  “Quando a produtora de elenco me ligou, eu achei que ela tinha ligado para a Valentina errada”, disse.

A atriz, que ficou conhecida do público ao fazer Bebeth em “Pega Pega” (Globo, 2017), disse que o seu trabalho foi se aproximar ao máximo do que Andréa Beltrão já tinha pesquisado e estava fazendo. “Mas eu também tive essa liberdade de criar a partir do estudo que tivemos da Hebe, porque essa fase que eu faço, especialmente dela com 15, 16 anos, não há muitos registros”, contou.

As duas revelaram que combinaram de fazer igual alguns gestos da artista, como a forma que ela segurava o volante ao dirigir, a gargalhada, a mão no rosto, o choro secando o olho. “A gente combinou algumas coisas, mas não muitas porque a semelhança física entre eu e a Valentina é imensa, né, nós somos absolutamente iguais, principalmente o nariz, ela fez plástica, eu ainda não…”, brincou Beltrão.

O diretor Maurício Farias afirmou que, em nenhum momento, a preocupação foi escolher atrizes que tivessem semelhanças físicas com a Hebe ou entre si.  “Eu fui procurar na persona de cada uma [das atrizes] o que isso se comunicava com a Hebe, de que maneira isso podia contar a história da Hebe.”

FONTE: FOLHAPRESS

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Gomes

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