Politica

Fundo Partidário deve seguir cota feminina de partidos

O ministro Luiz Fachin afirmou que a exclusão das mulheres da política é histórica, mas que democracia só será plena quando ouvir a voz delas

O financiamento de campanhas eleitorais de mulheres deve ser no mínimo equiparável à ação afirmativa que determina 30% de candidaturas femininas. Por esse motivo, o Supremo Tribunal Federal decidiu, na tarde desta quinta-feira (15/3), que limitar o percentual de verbas do Fundo Partidário destinado às candidatas é inconstitucional.

A regra derrubada previa que no mínimo 5% e no máximo 15% dos recursos do Fundo Partidário tinham de ser reservados para candidaturas das mulheres. Esses valores também não eram exclusivos às campanhas, mas abrangiam outras finalidades, como programas de incentivo à participação das mulheres na política.

O dispositivo que determinava vigência para a aplicação dos limites para três eleições (2016, 2018 e 2020) também não foi considerado válido. As definições constavam da minirreforma eleitoral de 2015. Foram oito votos contra dois no julgamento da ação direta de inconstitucionalidade apresentada pela Procuradoria-Geral da República. A PGR argumentou que a norma desprotegia o pluralismo político, a cidadania e o princípio democrático. Os ministros Marco Aurélio e Gilmar Mendes ficaram vencidos.

Relator do caso, o ministro Luiz Edson Fachin afirmou que a exclusão das mulheres da política é histórica. Ele citou Bertha Lutz, proeminente sufragista brasileira e uma das primeiras deputadas do país. Em 1945, quando da criação da Organização das Nações Unidas, ela disse: “Nunca haverá paz no mundo enquanto as mulheres não ajudarem a criá-la”. Fachin completou: “A democracia só será plena quando tornar audível a voz das mulheres”.

“É preciso reconhecer que ao lado do direito a votar e ser votado, a completude desse direito é alcançada quando se tem os meios para tal. Caso contrário, a letra constitucional apenas alimentará o indesejado simbolismo das intenções que nunca se concretizam no plano das realidades”, afirmou. Para ele, a ampliação da participação pública feminina permite equacionar as medidas destinadas ao atendimento das demandas sociais das mulheres.

Fachin ainda citou estatísticas e pesquisas de cientistas políticos que tratam da sub representação feminina na política. Ele defendeu dar interpretação conforme a Constituição para equiparar o mínimo de 30% de candidaturas femininas estabelecido pela Lei Eleitoral (Lei 9.504/97) ao percentual mínimo de recursos do Fundo (30%). O ministro disse ainda que a autonomia dos partido não os autoriza a oferecer tratamento discriminatório contra mulheres.

Marco Aurélio abriu divergência, a partir da qual uma discussão foi colocada no Plenário. “Não vejo como atuarmos como legisladores positivos e fixar os 30% como percentagem para as campanhas das mulheres. Dou interpretação conforme a Constituição para limitar qualquer tentativa de fixar outros percentuais”, disse Marco Aurélio. Ele derrubou os limites de 5% a 15%, mas entendeu como inadequado estabelecer o mínimo de 30% para o repasse. Gilmar Mendes o acompanhou.

Apesar de previsto para a pauta do Plenário anteriormente, o debate sobre participação de mulheres na política coincidiu com a execução da vereadora do PSOL do Rio de Janeiro Marielle Franco. O caso foi mencionado nas sustentações orais, bem como alguns ministros fizeram referência à morte daquela que foi a 5a vereadora mais votada da capital carioca.

Nas sustentações orais feitas, o caso foi levado ao Plenário. O vice-procurador-geral da República, Luciano Mariz Maia, afirmou que a luta por reconhecido e dignidade traz exemplos de dor e de sangue. “Hoje acordamos atingidos pelas balas que mataram a vereadora Marielle Franco, no Rio, e que atingem em cheio a democracia”, afirmou.

Ele disse ainda que Marielle, uma mulher, negra, de comunidade do Rio de Janeiro, elevou sua voz para fazer silenciar as injustiças. “Se a ela tentaram calar e derrubar, devem saber que não podem deter o rumo da história”, apontou antes de entrar no tema específico da sessão. Então ele defendeu que democracias não se dão apenas na formalidade, mas exigem condições para que se concretize. No momento, segundo ele, os partidos “têm faces masculinas” e as mulheres estão ausentes e silenciadas nos espaços de poder.

Polianna Pereira dos Santos, representando a Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político, disse que participação é requisito para a consideração de uma sociedade como democrática. “O Brasil está muito mal representado nesse sentido”, disse. “Quando a lei estabelece que apenas de 5% a 30% são destinados às mulheres, quer dizer em sentido inverso que os homens terão acesso de 85 a 95% dessas verbas. Os homens, estão sendo francamente privilegiados por essa alteração legislativa”, ressaltou.

Ela defendeu ainda que a autonomia partidária é suprimida a considerar que, ainda que o partido quisesse destinar recursos de forma paritária, não poderia fazê-lo sem violar o texto legal. Polianna Pereira dos Santos concluiu fazendo menção à vereadora assassinada: “Marielle Franco, presente!”.

Pela organização Cepia (Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação), falou a advogada Ligia Fabris Campos. “A inconstitucionalidade desse dispositivo é gritante, uma vez que cria por lei uma desigualdade em prejuízo de um grupo já desfavorecido, e assim, afronta frontalmente o princípio constitucional da igualdade entre homens e mulheres. Ou seja, homens podem ter 100% dessas verbas e mulheres ficam com até 15%”, argumentou Campos. Ela afirma que a lei é um retrocesso retumbante.

“Hoje discutimos aqui a participação da mulher na política brasileira. Ontem Marielle foi brutalmente assassinada, pagou por sua vida por estar na vida pública, lugar que é sistematicamente negado a pessoas como ela. Esse é mais um capítulo da história da exclusão das mulheres no Brasil”, lamentou.

FONTE: CONJUR

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