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Pessoas com diabetes lutam por tratamento no SUS para evitar cegueira

Incorporação de medicamento usado na rede particular desde 2016 está em consulta pública. Tratamento para o Edema Macular Diabético custa R$ 10 mil por ano. Ministério da Saúde considera valor muito alto e recusa inclusão. Gastos após a pessoa ficar cega são três vezes maiores. Fabricante oferece 70% de desconto e projeta economia de até R$ 478 milhões ao governo. “Queremos a incorporação, precisa haver participação significativa da sociedade”, diz presidente de associação que defende os direitos dos pacientes. Brasil tem 13,7 milhões de pessoas com diabetes, é o quarto país no mundo com prevalência da doença.

O Ministério da Saúde está avaliando a incorporação ao Sistema Único de Saúde (SUS) do mais atualizado tratamento para impedir a evolução do Edema Macular Diabético (EMD), uma das principais causas de cegueira no Brasil e no mundo.

‘Eylia’ (Aflibercepte), fabricando pela Bayer e aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), está em uso na rede particular desde 2016. A consulta pública sobre o assunto pode ser respondida pela população até quinta-feira, 18 de julho (clique aqui para participar).

“A recomendação preliminar da CONITEC (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) foi NÃO favorável à proposta de incorporação do Aflibercepte para o tratamento de Edema Macular Diabético”, diz o questionário. “Você concorda?”, pergunta o Ministério da Saúde, com a possibilidade de quatro respostas.

1- Concordo totalmente com a recomendação preliminar
2- Concordo parcialmente da recomendação preliminar
3- Discordo parcialmente da recomendação preliminar
4- Discordo totalmente da recomendação preliminar

DIREITOS DO PACIENTES – “O acesso a tratamentos é um direito do paciente”, diz Maria Julia da Silva Araújo, presidente da Retina Brasil. “Estamos acompanhando esse processo desde o começo e queremos a incorporação do remédio. Essa perda de visão, que é evitável, pode ser irreversível quando não há tratamento. É uma condenação à cegueira”, alerta Maria Julia.

“Discordamos totalmente da recomendação preliminar, mas sabemos que não será fácil reverter a posição inicial da comissão”, reconhece. “A consulta pública é uma ferramenta que nós temos que usar, mas precisa haver participação significativa da sociedade, porque isso pode reverter o primeiro parecer”, completa a presidente da Retina Brasil.

Quando a Retinopatia Diabética, que afeta os vasos sanguíneos da retina, chega os vasos centrais (mácula), surge a complicação chamada de Edema Macular Diabético. Aproximadamente 7% das pessoas com diabetes desenvolvem EMD no Brasil”, explica a oftalmologista Wania Freire, gerente médica da Bayer e responsável pelo Eylia.

“Estima-se que 4,8% das pessoas com diabetes podem ficar cegas por causa da doença”, diz a especialista. “A projeção até 2030 é de 191 milhões de pessoas com Retinopatia Diabética no mundo. E mais de 2 milhões terão a visão comprometida”, comenta a oftalmologista. “O Brasil tem 13,7 milhões de pessoas com diabetes, é o quarto país com prevalência da doença entre seus habitantes”, alerta Wania Freire.

Com ampla experiência em atendimento oftalmológico à população carente em unidades básicas de saúde e no ambulatório de retina da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), a gerente médica da Bayer afirma que a falta de tratamento correto para o Edema Macular Diabético, reduzindo o inchaço da retina e evitando a formação de novos vasos sanguíneos defeituosos, provoca a perda gradual da capacidade de enxergar, começando com um embaçamento, seguido por redução de cores, até que surge uma mancha no centro da visão que vai se expandindo e cobre tudo.

“O SUS não tem PCDT (Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas) para EMD, não há sequência patronizada de tratamento ou política pública”, ressalta a oftalmologista da Bayer. “Atualmente, o sistema público atua no controle do diabetes. No caso da Retinopatia Diabética, oferece tratamento com laser, que tem 50% de eficácia. Isso significa que metade das pessoas tratadas não apresenta melhora e continua perdendo a visão. Além disso, há risco de lesão nas partes boas da retina”, avalia a médica.

Para a coordenadora de advocacy da ADJ Diabetes Brasil, Vanessa Araújo Montanari, a consulta pública em andamento pode provocar uma reflexão do Ministério da Saúde e resultar em uma decisão favorável à incorporação do Eylia.

“Precisamos de uma grande participação popular. O Edema Macular Diabético tira a autonomia do indivíduo, afeta emocionalmente até quem está ao seu redor. Uma pessoa em idade produtiva é retirada do mercado de trabalho e segue para uma aposentadoria precoce, o que gera impacto não programado na Previdência”, destaca Vanessa.

UMA DÉCADA – A Bayer conversa com o Ministério da Saúde sobre o tratamento do Edema Macular Diabético há dez anos. “Estamos em uma busca conjunta por opções que tragam benefícios mútuos”, diz Sandra Abrahão, diretora médica da Bayer Brasil. “A falta de um protocolo para EMD pode gerar tratamentos equivocados, principalmente em regiões mais remotas”, destaca.

“Estudos de farmacoeconomia constatam que os gastos diretos e indiretos para acompanhamento do paciente que fica cego por causa do Edema Macular Diabético chegam a R$ 37 mil por ano”, explica a diretora.

O tratamento com o Eylia é feito no consultório, coberto por planos de saúde. De acordo com Philip Glaser, gerente médico de oftalmologia da Bayer Brasil, o custo no primeiro ano chega a R$ 10 mil, com redução para R$ 5 mil no ano seguinte. São valores regulados pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), vinculada à Anvisa. A Bayer ofereceu ao governo do 70% de desconto nesses valores.

“A indústria tem feito seu papel, oferecendo preços baixos. A consulta pública é o momento do cidadão se posicionar, precisa ter participação de hospitais, médicos, prefeituras, profissionais de saúde. A Bayer acredita que a incorporação é possível, a partir das respostas dessa consulta pública”, diz Glaser.

“Percebemos que o governo está aberto para novos medicamentos e tratamentos, mas essa avaliação deixa de observar os gastos com o não tratamento do paciente. Isso precisa avançar porque 75% da população brasileira não têm plano de saúde e muitos acabam buscando a Justiça”, destaca o gerente.

Para a diretora da Bayer, existe um esforço, mas o tema é sensível porque há muitas tecnologias para incorporação. “É necessário priorizar patologias mais graves, doenças incapacitantes, ampliar a visão sobre a situação do paciente”, ressalta Sandra Abrahão.

“Existe uma necessidade real, todos os motivos para a não incorporação estão no âmbito financeiro, mas é uma questão relevante de saúde pública, que tem de ser acessível à população mais carente”, completa a diretora médica da Bayer Brasil.




CONSULTA PÚBLICA – É um mecanismo de publicidade e transparência utilizado pela administração pública para obter informações, opiniões e críticas da sociedade a respeito de determinado tema. Esse mecanismo busca ampliar a discussão sobre o assunto e das base às decisões sobre formulação e definição de políticas públicas.

Para promover a participação da sociedade no processo de tomada de decisão para a inclusão de medicamentos e outras tecnologias no SUS, a CONITEC divulga suas recomendações em consulta pública por um prazo de 20 dias. Excepcionalmente, esse prazo pode ser reduzido para 10 dias em situações de urgência.

FONTE: ESTADÃO CONTEÚDO

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