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Discurso do ódio contra jornalistas cresce no mundo, inclusive no Brasil

País caiu no ranking anual da Repórteres sem Fronteiras e fica cada vez mais próximo da zona vermelha da classificação da ONG

O discurso do ódio contra os jornalistas se transformou em violência, o que levou a um aumento do medo em exercer a profissão no mundo. É o que mostra a edição de 2019 do Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa, publicado nesta quinta-feira pela organização Repórteres sem Fronteiras (RSF). Ameaças, insultos e agressões fazem agora parte dos “riscos ocupacionais” da profissão em muito países, incluindo o Brasil, que caiu três posições no ranking e ocupa o 105º lugar, cada vez mais próximo da zona vermelha da classificação (que indica situação difícil para profissionais de imprensa).

— Se o debate político desliza, de forma discreta ou evidente, para uma atmosfera de guerra civil, onde os jornalistas se tornam bodes expiatórios, os modelos democráticos passam a estar em grande perigo — alerta Christophe Deloire, secretário geral da RSF.

No Brasil, a eleição de Jair Bolsonaro em outubro de 2018, após uma campanha marcada segundo o relatório, por discursos de ódio, desinformação, ataques à imprensa e declarações controversas sobre direitos humanos, é um prenúncio de um “período sombrio para a democracia e a liberdade de expressão no país”, afirma o documento.

“Em um país onde dois terços da população se informam pelas redes sociais, a plataforma de mensagens WhatsApp desempenhou um papel central na campanha (…) e tomou o lugar das fontes tradicionais de informação”, afirma o relatório. “Nesse contexto tenso, os jornalistas brasileiros tornaram-se um alvo preferencial, e são regularmente atacados por grupos disseminadores de ódio, especialmente nas redes sociais.”

Na Venezuela, a situação é igualmente preocupante. Este ano, o país perdeu mais cinco posições e se aproxima perigosamente da parte mais baixa do ranking, em 148º lugar. Em 2018, a repressão se intensificou contra a impre

nsa e a RSF registrou um número recorde de detenções arbitrárias e casos de violência contra jornalistas praticados por forças de segurança e pelos serviços de inteligência.

A deterioração da situação levou muitos profissionais de imprensa a deixarem o país para fugir de ameaças e preservar sua integridade física.

— Houve uma migração em massa de jornalistas mais jovens — explicou ao GLOBO a jornalista Luz Mely Reyes, uma das criadoras do site Efecto Cocuyo. — Além da crise do modelo jornalístico, que é internacional, e da crise econômica interna, há perseguição e censura prévia, levando muitos profissionais a deixarem o país.

No ano passado, a Comissão Nacional de Telecomunicações (Conatel) da Venezuela ainda suspendeu o sinal de canais de rádio e televisão considerados muito críticos, e dezenas de jornalistas estrangeiros foram detidos, interrogados e deportados.

Este ano, o continente americano registrou a maior degradação do indicador regional, um resultado que não se deve apenas ao mau desempenho no Brasil e na Venezuela, mas também em países como Nicarágua e até Estados Unidos, hoje em 48º lugar no ranking. O país, onde um clima cada vez mais hostil se instalou na esteira da postura do presidente Donald Trump frente aos meios de comunicação, perdeu três posições em 2019 e caiu na zona laranja, onde se situam nações consideradas problemáticas para o exercício do jornalismo.

O ódio aos meios de comunicação é tanto que, em Maryland, um homem abriu fogo deliberadamente na redação do diário local de Anápolis, “The Capital Gazette”, deixando cinco mortos. O assassino havia compartilhado amplamente a sua raiva do jornal nas redes sociais.

“Os jornalistas americanos nunca haviam sido alvos de tantas ameaças de morte. Tampouco tinham recorrido a empresas privadas para garantir sua segurança”, alerta o documento da RSF.

A Nicarágua, que caiu 24 posições, sofreu uma das quedas mais significativas em 2019. Lá, os jornalistas que cobrem os protestos contra o governo de Daniel Ortega, vistos como opositores, são frequentemente agredidos. Muitos deles foram forçados ao exílio para escapar de ameaças e acusações de envolvimento com o terrorismo, afirma o relatório.

O continente abriga também um dos países mais mortais do mundo para exercer a profissão, o México, onde pelo menos dez jornalistas foram assassinados em 2018. Entretanto, a chegada ao poder do presidente Andrés Manuel López Obrador, em dezembro de 2018, após uma campanha eleitoral marcada por numerosos ataques a jornalistas, acalmou em alguma medida as relações entre o poder público e a imprensa mexicana, mostra o relatório. A transição política, junto a uma diminuição relativa no número de assassinatos no país (onze casos em 2017), justificam um ligeiro avanço do país no ranking, subindo três posições.

Na Europa, ataques verbais contra a profissão e uma retórica antimídia de maneira geral também estão cada vez mais presentes em muitas democracias, indica o texto publicado nesta quinta-feira. “Os jornalistas são declarados indesejados, ameaçados, insultados por personalidades que estão no mais alto nível do poder”.

A tendência está crescendo, particularmente na França, onde o líder do partido  França Insubmissa, Jean-Luc Mélenchon, declarou que o ódio aos jornalistas era “saudável e justo”.

No país, o ódio à mídia, uma das principais características da raiva dos “coletes amarelos”, é a ilustração mais preocupante disso, e foi brutalmente manifestada com agressões e intimidações sem precedentes. Uma repórter da “La Dépêche du Midi“ chegou a ser ameaçada de estupro e insultada por uma horda de manifestantes revoltados em Toulouse em janeiro.

O documento da RSF mostra ainda que o número de países onde os jornalistas podem exercer com total segurança sua atividade profissional continua diminuindo, enquanto os regimes autoritários reforçam seu controle sobre os meios de comunicação. É o caso da Rússia, em 149º lugar, onde o Kremlin aumentou a pressão contra a mídia independente na Internet, com prisões, buscas arbitrárias e leis mordaças.

A África, por sua vez, teve a menor degradação regional da edição de 2019 do ranking. Uma mudança de regime permitiu que a Etiópia esvaziasse suas prisões de jornalistas e desse um salto espetacular de 40 posições. Foi também uma alternância política que permitiu a Gâmbia apresentar uma das altas mais importantes do relatório, subindo 30 posições.

FONTE: O GLOBO

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Marcio Martins martins

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