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Cadela morta em Carrefour apareceu no mercado semanas antes e recebia atenção de lojistas

Dizem que o cão é o melhor amigo do homem, mas a recíproca nem sempre é verdadeira. A mostra mais recente é a brutal agressão e morte de uma cadela em um supermercado na zona metropolitana de São Paulo — a cena foi gravada e causou revolta nas redes sociais. A simpática vira-lata branca com manchas no pelo, chamada por alguns de “Fur” (pelo em inglês), apareceu em novembro na porta do Carrefour de Osasco e foi logo adotada e cuidada por lojistas — até ser morta a pauladas por um vigilante pouco mais de uma semana depois, dizem funcionários.

O segurança foi intimado a depor pela Delegacia do Meio Ambiente, mas, até as 14h desta quarta-feira não compareceu até a delegacua para prestar depoimento. O funcionário foi afastado do trabalho. Famosos e anônimos se indignaram na internet e protestos foram convocados contra o supermercado. Mas o caso evidencia também a distância entre comoção e solução para situações desse tipo.

As penas para crimes de agressão e maus tratos a animais preveem detenção de até um ano, mas frequentemente derivam em prestação de serviços comunitários ou pagamentos de cestas básicas e são consideradas brandas por ativistas. Só a ONG Bendita Adoção, de São Paulo, recebe entre 20 e 30 denúncias e pedidos de resgate de animais por dia. Mal consegue atender um caso por mês, com a sede já lotada de animais maltratados por cuidar – e a média de adoção é de apenas um animal a cada dois meses.

“Fur” não tinha dono, mas era querida pelos funcionários. Os lojistas de estabelecimentos contíguos ao supermercado se encarregavam de alimentá-la. Virou um cão comunitário, contaram empregados do local, tanto que havia dúvidas sobre seu verdadeiro nome e até sobre seu gênero – para alguns lojistas, “Fur” era macho.

— Era um cachorro dócil, ia com todo mundo, estava sempre contente. Apareceu um dia e foi ficando, cuidado pela gente — disse uma funcionária, que não quis se identificar por temor a represálias na empresa.

Segundo os funcionários do supermercado, o clima é “tenso” desde que as imagens caíram na internet. A agressão aconteceu na manhã de 28 de novembro.

— Era reinauguração dessa loja, viriam diretores e supervisores e decidiram sumir com o cachorro. Mas podiam ter chamado a carrocinha, não precisava matar. Ela era muito meiga — disse outra funcionária.

Não há confirmação de que a ordem tenha partido de superiores. Quem aparece nas imagens é um segurança, de uma empresa terceirizada, carregando uma barra de ferro. Em outras fotos, a cachorra aparece já bastante ferida. Funcionários afirmam que “Fur” chegou a entrar uma ótica ao lado do mercado, deixando um rastro vermelho no chão. Disseram, ainda, que o vigilante já tinha tentado enforcar e envenenar o animal.

Em nota, o Carrefour afirma que “repudia qualquer tipo de maus-tratos contra animais” e que está colaborando com as autoridades. Segundo o supermercado, “o cachorro estava circulando pelo estacionamento há alguns dias” e “ o Centro de Zoonoses de Osasco foi acionado por diversas vezes, mas não recolheu o animal”. No dia do incidente, diz a nota, “clientes se queixaram sobre a presença do cachorro, e, novamente, o órgão foi acionado. Um funcionário de empresa terceirizada tentou afastá-lo da entrada da loja e imagens mostram que esta abordagem pode ter ocasionado um ferimento na pata do animal”.

O texto não descreve, porém, que o animal já foi recolhido praticamente morto, por funcionários da Prefeitura, e levado a uma clínica veterinária, onde morreu. A denúncia de agressão só surgiu dias depois – a data de registro do boletim de ocorrência é o dia 3 deste mês.

O documento afirma que “Fur” foi encontrada no estacionamento do supermercado, “apresentando sangramento substancial”. Foi encaminhada a uma veterinária que diagnosticou “hemorragia digestiva alta e outros males decorrentes”. Durante o atendimento e manobras de reanimação, ela “apresentou parada respiratória e sucumbiu”, morrendo poucas horas depois da agressão. “Fur” foi retirada pela Ecoosasco e encaminhada para incineração. Como a denúncia só veio à tona vários dias depois, não foi possível determinar se houve também envenenamento, pois o corpo fora cremado.

Revolta de clientes

No pátio de estacionamento do supermercado, clientes se mostraram revoltados. Uma caixa disse que o movimento estava abaixo do normal. Um cliente chamou a atenção para a ausência de consumidores numa quarta-feira, dia de promoção da feira. Outros funcionários afirmam que a direção do supermercado não esperava tamanha repercussão.

— Não gosto de cachorro, não sou de ficar abraçando, dormindo na mesma cama. Mas é absurdo matar um animal por matar. Nada justifica. Meus filhos são apaixonados por cachorro e disseram para eu não vir mais nesse mercado — disse a dona de casa Elisabete.

Alguns carros mais à frente, no estacionamento, a autônoma Ângela Pissinati guardava as compras entre um lamento e outro:

— O agressor deveria ser preso. É uma maldade sem justificativa. Já resgatei muitos animais na rua. Vim hoje ao mercado com raiva. E está bem mais vazio do que o normal.

O filho, Guilherme, disse que viu o vídeo da agressão a “Fur” na internet:

— O que mais impressiona é que ninguém fez nada para parar a agressão.

Já o motorista de aplicativo Lucien Esteves chamou a atenção para a quantidade de seguranças no estacionamento e na porta do Carrefour.

— Nunca vi nada assim. Devem estar com medo de protestos. Trago muito passageiro aqui e já vi esse cachorro várias vezes. Era sempre muito dócil, brincava com todo mundo. Nunca avançou em ninguém. Gosto muito de animais. Mas mesmo quem não gosta não tem por que maltratar. Foi uma crueldade — disse ele, que tem um poodle em casa.

Uma manifestação foi convocada para sábado à tarde na porta do Carrefour. A ideia dos organizadores é partir do caso de “Fur” para lembrar a fragilidade da vida animal. Na internet, surgiram convocatórias para atos em outras unidades da rede de supermercados.

— Esperamos que isso abra um precedente para uma mudança de lei. Os animais são tratados como objeto, mas são sujeitos de direito. Hoje um agressor de crime ambiental normalmente responde em liberdade, paga multa, presta serviço social. Precisamos de punições mais severas, e de leis que obriguem municípios e estados a terem abrigos. Osasco tem um centro de controle de zoonoses, mas é para controle de doenças, não para resgate — diz Beatriz Silva, porta-voz da ONG Bendita Adoção.

Punição com cestas básicas

Segundo ela, as ONGs têm muita dificuldade para adotar animais lesionados por exploração, sofrimento e maus-tratos. A sede tem principalmente cães e gatos paraplégicos, que vão viver lá para o resto da vida.

— As pessoas só querem o filhotinho saudável. Temos animais idosos e há mais de um ano não conseguimos um dono. Dos paraplégicos, faz mais de dois anos que ninguém se interessa — conta Beatriz.

Segundo o delegado Bruno Lima, que auxilia no caso de “Fur”, o inquérito deve ser concluído entre sexta-feira e a próxima segunda.

— As testemunhas já estão sendo ouvidas. O Carrefour forneceu as imagens, e o objeto com que o animal foi agredido foi apreendido ontem. Falta ouvir o autor da agressão — afirmou.

Depois de ouvido, o agressor deverá ser indiciado pela polícia, o que dará início a um processo judicial. Se ao final da ação ele for considerado culpado, pode cumprir uma pena alternativa, que pode variar de prestação de serviços à comunidade ou pagamento de cestas básicas.

FONTE: EXTRA

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